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O Superior Tribunal de Justiça decidirá o cabimento de alegação de prescrição em contrarrazões de recurso

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça uniformizará entendimento quanto a possibilidade de alegação de prescrição em contrarrazões de recurso, nos casos em que a matéria não foi abordada por recurso próprio.

Os embargos de divergência tiveram origem na Ação de Revisional de Contratos de Empréstimo c/c Repetição de Indébito, que tramita na 1ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de Porto Alegre/RS, processo nº: 0182641-64.2018.8.21.0001, ajuizada por particular em face de FUNCORSAN – FUNDAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DA CORSAN.

O Autor/Mutuário, distribuiu a Ação Revisional no ano de 2018, alegando incidência de encargos abusivos nos contratos de mútuo pactuados, pleiteando a tutela jurisdicional para a revisão dos termos no que tange à limitação dos juros estabelecidos, exclusão da capitalização mensal, recálculo da taxa administrativa e autorização de compensação de valores.

Em contraponto, o Réu/Mutuante em sede de contestação, suscitou preliminar de prescrição trienal e falta de interesse processual quanto a capitalização mensal dos juros, negando a sua incidência, afirmando em mérito a inexistência de abusividade das cláusulas contratuais.

Processados os autos em primeira instância, a lide foi dirimida por sentença de mérito, pela qual o juízo a quo, embora tenha afastado a tese de prescrição trienal alegada pelo réu em contestação (art. 206, §3º, inciso IV, do CC), julgou totalmente improcedente a pretensão do Autor, condenando-o ao pagamento de custas e honorários advocatícios, aos seguintes fundamentos: a) liberdade de estipulação de juros remuneratórios, sem implicação de abusividade (Súmula nº 382 do STJ); b) possibilidade de capitalização de juros, em periodicidade inferior à anual, desde que expressamente pactuada (Súmulas 539 e 541 do STJ); c) viabilidade de incidência de taxa de administração nos contratos de mútuo como contrapartida pecuniária das despesas decorrentes dos custos de gerenciamento; e d) não cabimento de compensação.

Inconformado com a decisão, o Autor interpôs recurso de Apelação perante o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, processo nº 0010373-85.2020.8.21.7000 / 70083720144, requerendo a reforma da Decisão para que fosse determinada: i) a limitação dos juros remuneratórios em 12% ao ano; ii) a vedação de capitalização dos juros remuneratórios (como pleito alternativo); iii) o recalculo da taxa de administração; iv) a compensação do indébito; e v) a redistribuição de ônus de sucumbência.

O Réu/Apelado não apresentou recurso à sentença proferida, uma vez que embora rejeitada a alegação de prescrição, os pedidos foram julgados improcedentes, o que lhe geraria carência de interesse recursal. Contudo, em sede de contrarrazões à Apelação interposta, o Réu arguiu em preliminar a prescrição trienal, pugnando pelo desprovimento do apelo.

Julgado o recurso pela Décima Nona Câmara Cível, por unanimidade de votos, foi dado provimento parcial ao apelo, acolhendo-se, as alegações do Apelante, para limitar juros à taxa de 12% ao ano, autorizando a repetição de indébito na forma simples, assim como, provendo a preliminar formulada em contrarrazões, reconhecendo a prescrição suscitada no período de 2003 e 2008. Ainda nesta instância, ambas as partes opuseram Embargos de Declaração, entendo o Tribunal, pela manutenção da Decisão e acolhendo apenas a correção de erro material.

Irresignadas, as partes interpuseram Recurso Especial perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ), buscando a revisão do Acórdão proferido em sede de Apelação (REsp 1.986.909 / RS – 2022/0046789-5).

A FUNCORSAN, alegou ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, suscitando violação ao art. 1.022 do Código de Processo Civil, firmando que o Acórdão não examinou a questão sob a ótica da Resolução nº 3.792/2009 do BACEN.

A parte adversa, alegou decisão ultrapetita e violação de cosa julgada, por ausência de recurso próprio para questionamento de matéria de ordem pública, imputando a preclusão de matéria relativa à prescrição provida e divergência de julgamentos quanto à matéria de prescrição.

Em juízo de admissibilidade, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, proferiu decisão com inadmissão do recurso da FUNCORSAN. Não obstante, admitiu o recurso da parte oposta, remetendo os autos ao Superior Tribunal de Justiça.

Em Acórdão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça acompanhando o voto da Ministra Relatora Nancy Andrighi, julgou parcialmente procedente o Recurso Especial interposto pelo particular, entendendo pela: a) inexistência de negativa prestação jurisdicional; b) inocorrência de preclusão e de julgamento fora dos limites da lide; c) termo inicial do transcurso do prazo prescricional em conformidade com jurisprudência do STJ; e d) reforma da base de cálculos de honorários advocatícios.

No que tange à prescrição, entendeu a Turma que, tendo em vista o julgamento integralmente improcedentes dos pedidos do Autor, à priori, o Réu não dispunha de interesse recursal para debater sobre o não acolhimento da prescrição alegada em contestação. O interesse voltou a surgir quando houve pedido de reforma da decisão por meio de recurso de apelação manejado pelo Autor. Neste momento, o Réu, não se valeu da apelação adesiva, arguindo a prescrição em sede de contrarrazões.

No Julgamento do Recurso Especial, considerou-se a ausência do interesse recursal do Réu face ao julgamento improcedente do pedido aviado. Os Ministros entenderam pela inocorrência da preclusão e pelo acolhimento da alegação de prescrição em sede de contrarrazões à apelação interposta pelo autor. O acórdão foi assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. PRECLUSÃO CONSUMATIVA DE MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. POSSIBILIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO NA ESPÉCIE. OBSERVÂNCIA DOS LIMITES DA LIDE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO REVISIONAL. TERMO INICIAL. ASSINATURA DO CONTRATO. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. BASE DE CÁLCULO. PROVEITO ECONÔMICO. 1. Ação revisional de contratos de empréstimo c/c repetição de indébito ajuizada em 12/12/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 25/01/2021 e concluso ao gabinete em 24/03/2022. 2. O propósito recursal é dizer sobre: a) a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional; b) a existência ou não de preclusão da matéria relativa à prescrição; c) o termo inicial do prazo prescricional da pretensão revisional de contrato bancário e d) a base de cálculo dos honorários sucumbenciais. 3. Não ocorre ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, examina fundamentada e expressamente todos os pontos relevantes para a solução da controvérsia, ainda que de forma distinta daquela pretendida pela parte.4. Se a sentença julgar integralmente improcedente a pretensão autoral, apesar de afastar a prescrição alegada pelo réu, não haverá interesse recursal deste para fazer prevalecer a tese relativa à prescrição. Assim, a interposição de recurso apenas pelo autor não acarreta a preclusão consumativa da matéria naquele momento processual. Nessa linha, na espécie, o reconhecimento da prescrição parcial da pretensão pela Corte de origem, em razão de argumento suscitado nas contrarrazões de apelação, não violou a coisa julgada nem configurou julgamento proferido fora dos limites da lide. 5. O início do prazo prescricional decenal nas ações de revisão de contrato de empréstimo em que se discute a legalidade das cláusulas pactuadas, deve ser a data da assinatura do contrato. Precedentes. 6. Os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados, em regra, com observância dos percentuais e da ordem de gradação da base de cálculo estabelecida pelo artigo 85, § 2º, do CPC/2015, nos seguintes termos: 1º) com base no valor da condenação; 2º) não havendo condenação ou não sendo possível valer-se da condenação, por exemplo, porque irrisória, com base no proveito econômico obtido pelo vencedor; ou 3º) não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, sobre o valor atualizado da causa (REsp 1.746.072/PR, Segunda Seção, DJe de 29/03/2019). Assim, havendo condenação à repetição do indébito, esse valor é que deverá servir de base de cálculo dos honorários advocatícios, porquanto reflete o proveito econômico obtido pelo recorrente (autor) na demanda, por corresponder ao resultado da diferença entre o valor originalmente cobrado e o apurado como efetivamente devido. 7. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.

Ciente do entendimento, o agora recorrido, opôs Embargos de Divergência, apontando o antagonismo da decisão quanto ao entendimento da Segunda e Quinta Turmas do STJ, que convergiam pela impossibilidade de utilização das contrarrazões para reforma de sentença, servindo apenas para suscitar a manutenção da decisão recorrida, devendo, tão só, impugnar os fundamentos do recurso interposto, consoante aos princípios de non reformation in pejus e tantum devilutum quantuim appellatum:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PRECLUSÃO DA MATÉRIA RELATIVA À PRESCRIÇÃO. RAZÕES DA SENTENÇA SUBSTITUÍDAS PELAS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. AUSÊNCIA DE RECURSO VOLUNTÁRIO DO ESTADO RECORRIDO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA NON REFORMATIO IN PEJUS E DO TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APPELLATUM. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. LEIS ESTADUAIS PAULISTAS N.os 4.819/58 E 200/74. INTEGRALIDADE DO BENEFÍCIO. 1. Os fundamentos da sentença relativos à prescrição do fundo de direito não subsistiram, sendo substituídos pelas razões constantes do acórdão recorrido e, nessas condições, sendo o recurso especial limitado à impugnação dos fundamentos desse último pronunciamento judicial, resta evidente que houve anuência quanto à conclusão relativa à prescrição. 2. As contrarrazões ao recurso especial tem como escopo apenas corroborar a necessidade de manutenção dos fundamentos esposados pelo Tribunal de origem, não se prestando a albergar pedido de reforma do aresto objurgado, consoante o princípio da non reformatio in pejus e o princípio do tantum devolutum quantum appellatum. 3. O tempo de serviço efetivo prestado pelos empregados admitidos até a data da vigência da Lei Estadual n.º 200/74 não acarreta prejuízos à percepção integral da complementação da aposentadoria, uma vez que a Lei não prevê a proporcionalidade do benefício. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no Ag n. 1.239.523/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 17/8/2010, DJe de 13/9/2010.)

 PROCESSUAL CIVIL. FORMULAÇÃO DE PEDIDO DE REFORMA EM CONTRARRAZÕES. VIA INADEQUADA. PRECLUSÃO. 1. A embargante aduz que há omissão quanto ao pedido de majoração da verba honorária suscitado nas contrarrazões do especial. 2. Contudo, as contrarrazões são cabíveis apenas para impugnar os fundamentos de eventual recurso interposto, com o intuito de manutenção da decisão exarada, mostrando-se via inadequada para suscitar pedidos de reforma de decisão, consoante os princípios da non reformatio in pejus e do tantum devolutum quantum appellatum. Precedentes. 3. Se o embargante entendia como inadequada a verba sucumbencial fixada, deveria ter usado, a tempo e modo, os recursos cabíveis para alcançar a majoração, tarefa da qual não se incumbiu, pois, da sentença que a fixou em R$ 2.000,00 (dois mil reais), nem sequer interpôs apelação para devolver a questão ao tribunal, tornando-a preclusa, visto que a não interposição do recurso voluntário por parte da autora gera a presunção de resignação diante do provimento jurisdicional apresentado. Embargos de declaração rejeitados. (EDcl no REsp n. 1.584.898/PE, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 2/8/2016, DJe de 10/8/2016.)

Os princípios adotados de non reformation in pejus e tantum devilutum quantuim appellatum, são definidos como uma forma de salvaguardar o recorrente quanto à possibilidade de alteração prejudicial.

Uma decorrência direta da voluntariedade dos recursos é que o recurso, em regra, somente poderá beneficiar a parte que recorreu. Em função do seu próprio recurso, o recorrente, salvo hipótese específica, não terá a sua situação jurídica piorada, tal como conte da decisão precedente.” (ARRUDA. Alvim. Contencioso Cível no CPC/2015: Proibição de reformation in pejus. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022).

Assim, ante a divergência entre a 3ª e a 2ª e 5ª turmas do STJ, sobre a possibilidade de alegação de prescrição em contrarrazões, nos casos em que o tema foi conhecido e não acolhido pela primeira instância, sendo suscitado somente em contrarrazões, sem interposição de recurso próprio, qual seja, apelação adesiva, os autos foram remetidos à Corte Especial.

Diante do exposto, será dirimida a divergência apontada nas decisões proferidas pela 2ª, 3ª e 5ª Turmas do STJ, unificando-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça pela viabilidade ou não da alegação de prescrição em sede de contrarrazões, nos casos em que a matéria não foi abordada por recurso próprio.

Graziela Andrade Paz de Faria

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