Superior Tribunal de Justiça entende pela possibilidade da extinção parcial da execução em face do consórcio, em razão da Recuperação Judicial do consorciado
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no dia 07/03/2023, ao apreciar o Recurso Especial nº 1.804.804/MS, entendeu pela extinção parcial da ação de cobrança ajuizada por TRATORANEL TRATORES LTDA em face de CONSÓRCIO UFN III, em razão da concessão da Recuperação Judicial da consorciada majoritária GALVÃO ENGENHARIA S/A, que novou os créditos sujeitos ao procedimento recuperacional.
Antes de adentrar no caso, é necessário destacar que o consórcio é um contrato firmado entre sociedades, independentemente do seu tipo societário, para executar de forma conjunta determinado empreendimento. Dessa forma, por se tratar de um contrato, tal instituto não é dotado de personalidade jurídica própria, sendo as consorciadas somente obrigadas às cumprirem com as condições contratuais, respondendo cada uma por suas obrigações, sem a presunção de solidariedade, conforme preceitua os arts. 278 e seguintes da Lei de Sociedade Anônima.
No tocante ao caso em questão, GALVÃO ENGENHARIA S/A e outras sociedades constituíram o CONSÓRCIO UFN III para realização de empreendimento em favor da PETROBRÁS. Dessa forma, a fim de executar o empreendimento, o consórcio (contratante) firmou contrato de locação de equipamentos sem mão de obra com a TRATORANEL TRATORES (contratada). No entanto, tempo após a celebração do contrato, a contratada alegou que o consórcio inadimpliu com a obrigação contratual e ajuizou a Ação de Cobrança contra o consórcio, buscando receber os valores devido do descumprimento contratual.
Em sede de contestação, o consórcio destacou que a consorciada majoritária, GALVÃO ENGENHARIA S/A, se encontrava em Recuperação Judicial e que os créditos em questão foram originados em momento anterior ao pedido de Recuperação Judicial e, consequentemente, possuíam natureza concursal, sujeitando-se aos efeitos da Recuperação Judicial.
Não obstante, acrescentou que o Plano de Recuperação Judicial (PRJ) da GALVÃO ENGENHARIA S/A (consorciada majoritária) já havia sido aprovado, alegando que tal ato gerou a novação do crédito discutido, ainda que este não tenha sido habilitado na Recuperação Judicial, razões pela qual pugnou pela improcedência do pedido inicial, afirmando que a discussão dos créditos deve ocorrer perante o Juízo Recuperacional.
Ao proferir a sentença, o Juízo da 4ª Vara Cível de Três Lagoas/MS destacou que: i) a ação de cobrança tramita em face do CONSÓRCIO UFN III e não da Recuperanda, razão pela qual destaca que não pode ocorrer a novação do crédito; ii) a ação de cobrança visa a constituição de título executivo para adimplemento da obrigação e por se tratar de crédito ilíquido, de modo que a referida demanda deveria prosseguir, conforme previsão do art. 6°, inciso I, da Lei 11.101/2005; e Iii) o crédito em questão teria sido originado em momento posterior ao pedido de Recuperação Judicial, razão pela qual destaca que o valor em questão não é sujeito aos efeitos da recuperação judicial.
Diante do exposto e do inadimplemento contratual, o magistrado julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando o CONSÓRCIO UFN III ao pagamento do valor atualizado das notas apresentadas nos autos, acrescidas da multa de 10% sob o valor do contrato. Contra esta Sentença, foi interposta Apelação, ao qual o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul negou provimento, mantendo integralmente a Sentença do Juízo de primeiro grau.
Inconformada com o Acórdão, a GALVÃO ENGENHARIA S/A interpôs o Recurso Especial nº 1.804.804/MS, requerendo a reforma do Decisão para: i) reconhecer a concursalidade do crédito; ii) extinguir a ação contra a Recorrente, visto que os valores já se encontram habilitados na Recuperação Judicial; iii) determinar que a responsabilidade das consorciadas fique limitada ao valor de suas quotas no consórcio.
Ao apreciar o Recurso Especial, o Relator, Ministro Antônio Carlos Ferreira, ressaltou que o crédito em questão é concursal, uma vez que o fato gerador do crédito ocorreu com a assinatura do contrato de locação de equipamento, a qual ocorreu em 16/06/2014, ou seja, momento anterior ao pedido de RJ (25/03/2015).
Além disso, o eminente Ministro Relator destacou que, em razão do crédito ser concursal, com a aprovação e homologação do Plano de Recuperação Judicial, ocorreu a sua novação, independentemente de ele se encontrar habilitado ou não na recuperação judicial. Diante disso, a dívida não poder ser executada contra a Recuperanda no âmbito da ação de cobrança.
No tocante ao consorcio, o Ministro Relator esclareceu que o limite e as condições da responsabilidade de cada consorciado decorrem do contrato constitutivo do consórcio; ou seja, se o ato constitutivo prever que os consorciados são solidários, a execução poderá prosseguir pelo valor integral da dívida em relação aos demais consorciados, haja vista que a quitação integral do valor, neste caso, pode ser realizada por qualquer um dos devedores.
No entanto, caso não haja previsão acerca da solidariedade, pelo fato de a obrigação ser divisível e com pluralidade de devedores, cada devedor somente pode ser responsabilizado por sua fração. Deste modo, a novação do crédito decorrente da concessão da Recuperação Judicial somente abrange a quota parte do consorciado que está em processo recuperacional, extinguindo-se a ação em relação à Recuperanda e sua quota parte do débito e prosseguindo-a contra os demais em relação ao valor remanescente, haja vista que a fração da Recuperanda não poderia ser cobrado de outro devedor.
Isto posto, o Ministro Relator destacou que para julgar o caso seria necessário verificar a solidariedade do consórcio, através da análise do contrato e dos aditivos, ato que viola a competência do STJ. Diante disso, o Relator prestou os esclarecimentos sobre os fatos apresentados e determinou o retorno dos autos ao Tribunal de origem para nova apreciação da causa, voto este que foi acompanhado pelo colegiado da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça.
Daniel Lucca Nascimento
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