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A importância do Administrador Judicial em uma falência transnacional

De acordo com o art. 167-A da Lei 11.101/05, introduzido pela Lei 14.112/20, o objetivo das regras de insolvência transnacional é proporcionar mecanismos efetivos para (i) cooperação entre os juízes e autoridades brasileiras e estrangeiras; (ii) aumentar a segurança jurídica para a atividade econômica e investimentos; (iii) a administração justa e eficientes dos processos de insolvências transnacionais, protegendo assim os interesses de todos os envolvidos (credores, devedores e demais interessados); (iv) proteger e maximizar o valor dos ativos do devedor; (v) promover a recuperação de empresa em crise, protegendo investimentos e preservando empregos; e (vi) promover a liquidação dos ativos do devedor, preservando e otimizando a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos da empresa.

Nesse contexto, é dever do Administrador Judicial arrecadar os ativos existentes em favor da Massa Falida, assim como identificar a ocorrência de eventuais fraudes perpetradas por meio de abuso de direito e confusão patrimonial, em prejuízo aos credores, adotando todas as medidas para responsabilizar quem de direito. Destaca-se que essa atividade não tem caráter discricionário, sendo, em verdade, um dever do Administrador Judicial, independente da jurisdição onde o ativo esteja, ou do local do domicílio do terceiro que eventualmente tenha causado prejuízo à massa de credores e que, portanto, deve indenizá-la.

Destaca-se que com a inserção do art. 167-E na Lei 11.101/05, também pela Lei 14.112/20, o Administrador Judicial na falência é autorizado a atuar em outros países, independentemente de decisão judicial, na qualidade de representante do processo brasileiro, desde que essa providência seja permitida pela lei do país em que tramitem os processos estrangeiros.

Em regra, nas jurisdições em que a Lei Modelo da Uncitral (United Nations Comission on International Trade Law) foi adotada, é permitido que o representante da Massa Falida ou em liquidação, inicie um procedimento auxiliar ao procedimento principal, perante outros países, que possibilita a esse Administrador Judicial ou liquidante estrangeiro exercer plenamente seus poderes inerentes à função, podendo, então, ouvir testemunhas naquele território, coletar documentos, encaminhar ofícios requerendo informações, etc.

Assim, considerando que se trata de dever do Administrador Judicial adotar todas as medidas para arrecadar ativos para pagar o passivo, a verdade lógica é que, em existindo indícios de fraude e ocultação de bens, devem ser adotadas as medidas judiciais pertinentes, seja no país onde tramita a falência ou em outras jurisdições onde existam ativos da Massa Falida a serem arrecadados ou ainda desviados de forma fraudulenta.

O Magistrado Daniel Carnio Costa, que preside a 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Estado de São Paulo, em Decisão tornada pública no final do ano de 2013, conceitua com maestria a questão relativa à falência fraudulenta e a importância de seu combate:

É comum que no processo falimentar, sobremaneira em período que antecede a decretação da quebra da empresa, os sócios esvaziem o patrimônio da pessoa jurídica transferindo-o fraudulentamente para seu patrimônio pessoal ou para terceiras pessoas utilizadas como escudo de proteção desses bens. A necessidade de se rastrear e buscar esse patrimônio desviado da falida é imperiosa, considerando não só a imposição da efetividade do processo como instrumento da jurisdição, mas também a proteção dos interesses em juízo que, no caso de processo falimentar, tem feição coletiva, transindividual, potencializando sua importância social [1].

Importante mencionar que, mesmo nos países em que a Lei Modelo não foi adotada, existem outras ferramentas jurídicas que podem ser adotadas pelo Administrador Judicial ou pelos credores, seja para identificar o beneficiário final de uma estrutura societária fraudulenta, ou para obter informações financeiras envolvendo interesses da empresa falida. É claro que a estratégia a ser adotada em cada caso deve ser objeto de acurado estudo, de acordo com as peculiaridades do caso, escolhendo-se quais serão os primeiros alvos da coleta de informação, sempre visando a preservação das provas, posto que no momento em que aquele que cometeu a fraude tomar conhecimento dos atos do procedimento de rastreamento, certamente será dado início à destruição de informações e ocultação de ativos, o que pode tornar inviável o êxito do trabalho.

Luanna Danielle da Rocha Dionísio

 

[1] Processo 0070520-25.2013.8.26.0100 (Viação Aérea de São Paulo).

COSTA, Daniel Carnio. Comentários à lei de recuperação judicial de empresas e falências. Volume III. Curitiba. Juruá, 2015.

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